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Dados pessoais protegidos como direito fundamental

Desnecessidade da PEC 17/2019


Por Andréa Silva Rasga Ueda em 22/05/2019 | Advocacia | Comentários: 0

Dados pessoais protegidos como direito fundamental

 

Enquanto a sociedade e a comunidade jurídica brasileira aguardam a conversão da MP 869/2018, em análise no Congresso Nacional e que cria a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, vinculado à ANPD, regulamentando e trazendo à plena vigência a Lei federal 13.709/2018 (LGPD), sem qualquer outro motivo, que não seja o midiático, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) opina pela admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 17, de 2019, que visa a acrescer o inciso XII-A, ao art. 5º, e o inciso XXX, ao art. 22, ambos da Constituição Federal para incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos fundamentais do cidadão e fixar a competência privativa da União para legislar sobre a matéria, respectivamente.

Muito se tem debatido e estudado no país a respeito do tema da proteção de dados, quer por conta da entrada em vigor na União Europeia, em 25.05.2018, do o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR), quer por conta da promulgação da nossa LGPD, mas sempre sob o ponto de vista unânime de que tal legislação (ou legislações) têm por foco a proteção direta do direito humano fundamental, a saber, o resguardo que toda pessoa humana tem sobre seus dados pessoais e o controle e a titularidade únicos da mesma sobre tais dados, sendo que o seu tratamento somente poderá ocorrer com sua anuência expressa, livre e prévia.

Como já escrevi em outro espaço, os dados pessoais, apesar de há tempos maltratados neste país, são essenciais para o desenvolvimento de uma nação e, por esse motivo, é imprescindível que, de forma ética, leal, equilibrada, juridicamente segura e transparente, seja realizada sua proteção, o que faz nossa LGPD.

De qualquer forma, nunca se discutiu a posição que a proteção de tais dados teria frente ao ordenamento nacional, ainda mais frente à própria Constituição Federal, visto que esta, em seu inciso III do art. 1º erigiu a dignidade da pessoa humana em fundamento da nossa República, bem como protege como direitos fundamentais e invioláveis, no inciso X do art. 5º, a intimidade, a vida privada e a imagem das pessoas, assegurando-lhes o direito a indenização pelo dano material ou moral advindos de sua eventual violação.

Ora, com base em tais dispositivos legais já temos a fundamentação legal necessária a embasar a proteção de dados como algo inerente aos cidadãos que desejam, livremente, se valer de sua privacidade (de dados, leia-se) e não queiram que uma determinada pessoa (física ou jurídica, conforme dispõe o caput do art. 1º da LGPD) trate dos mesmos sem sua anuência expressa, livre e prévia.

Tanto isso é verídico que a própria LGPD, em seu art. 2º, dispõe que “a disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos”, dentre outros, “o respeito à privacidade” (inciso I, “a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem” (inciso IV) e “a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais” (inciso VII), o que já corrobora a desnecessidade de qualquer outra movimentação legislativa para tornar tal proteção alçada a um direito fundamental.

E quanto a fixar à União Federal competência privativa para legislar sobre a matéria, a proposta na própria MP é de que a ANPD (que, se aprovada no formato apresentado, estará atrelada à Casa Civil, órgão ligado diretamente ao Poder Executivo do Governo Federal) terá a competência para editar normas e procedimentos relacionados à proteção de dados.

Ademais, se pensarmos do ponto de vista macro, poderíamos dizer que a proteção de dados estaria ligada ao direito da personalidade da pessoa humana, objeto de proteção pelos artigos 11 a 21 do Código Civil (Direto Privado), mas igualmente albergado na Constituição Federal, como já vimos. Nesse sentido, matéria de Direito Civil é afeta à competência exclusiva da União Federal.

Assim, totalmente desnecessária uma PEC a esta altura para falar mais do mesmo, dando azo a mudança na Constituição Federal de forma despropositada e reforçando a colcha de retalhos em que colocaram nosso texto legal maior.

Deixem a MP 869/2018 tramitar; decidam logo os seus rumos legais para que tenhamos em vigência a LGPD de forma uniforme e eficaz; parem de atos midiáticos e sem eficácia legal real.

Não podemos perder de vista a última ratio da LGPD: impulsionar um desenvolvimento econômico e financeiro empresarial em harmonia com a manutenção do fator primordial - o humano.

Entendendo a LGPD sob essa óptica, que nada mais representa do que a prática dos princípios da livre iniciativa e o da dignidade da pessoa humana dispostos no art. 1º da nossa Constituição, e num momento de crises pelo qual passamos, em diversas frentes, encontraremos motivação correta para chegarmos a uma legislação plenamente eficaz e eficiente. Sem melindres e egos e sem criarmos pânico no mercado.

 

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Ibijus


Sobre o autor

Andréa Silva Rasga Ueda

Bacharel (1993), Mestre em Direito Civil (2009) e Doutora em Direito Civil (2015), todas pela USP, atuando como advogada desde 1994, tendo atuado até 2006 em escritórios próprio e de terceiros (médio e grande portes), com grande experiência no consultivo e contencioso civil (especialmente em contratos), comercial, societário (elaboração de atos societários de Ltdas. e S.As, de capital aberto e fechado; participação em M&A, IPOs, Private Placement), bem como em transações imobiliárias e questões envolvendo mercado de capitais e compliance. De 2007 até 2018 criei e gerenciei departamentos jurídicos de empresas nacionais e transnacionais. Atualmente atuo como consultora jurídica corporativa e como diretora jurídica na startup de geração distribuída Sunalizer, com atuação nacional e internacional. Forte experiência no regulatório de energia e GD, de 2007 a 2012 e 2018-atualmente, de mercado de capitais e de construção de torres para suporte às antenas de empresas de telecomunicações (desde 2013). Professora da Escola Superior da Advocacia (ESA-SP), entre 2001 e 2002, na matéria de Prática em Processo Civil, bem como assistente de professor na matéria Direito Privado I e II, na Faculdade de Direito da USP, durante o ano de 2007. Especializações: Consultivo civil/empresarial (Contratos) e societário; M&A e atuação em estruturações de operações financeiras; mercado de capitais; regulatório de energia e telecomunicações. Meu site é: deaalex.wordpress.com. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/6450080476147839


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