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A prescrição de reparação civil contratual e a proteção de dados

Um ponto a partir de decisão do STJ


Por Andréa Silva Rasga Ueda em 19/05/2019 | Direito Civil | Comentários: 0

Tags: Contratos.

A prescrição de reparação civil contratual e a proteção de dados

 

Em julgado recente do STJ, nos Embargos de Divergência em Recurso Especial da ESP Nº 1.280.825 - RJ (2011/0190397-7), a corte manteve o entendimento, já de há anos (pelo menos de 2008 até meados de 2016), no sentido de que, para os casos de reparação civil decorrente de danos por ilícito contratual não se aplicaria o prazo prescricional de 3 (três) anos disposto no art. 206, parágrafo 3º, inciso V, do Código Civil, mas, sim, o de 10 (dez) anos, do artigo 205 do mesmo diploma legal.

Essa decisão foi tomada pela 2ª Turma apesar de essa mesma Turma, após quase uma década de jurisprudência firmada no sentido de que se aplicaria o prazo decenal à responsabilidade contratual, por conta do julgamento do REsp 1.281.594/SP (Terceira Turma, DJe 28/11/2016), já ter entendido que o prazo prescricional deveria ser o mesmo que da responsabilidade civil extracontratual, a saber, três anos, em julgado de novembro de 2016.

Com base na interpretação literal (pois o termo reparação civil não albergaria a extracontratual), na interpretação sistêmica (“dez anos deve ser aplicado a todas as pretensões do credor nas hipóteses de inadimplemento contratual, incluindo o da reparação de perdas e danos por ele causados”) e na conjugação de fato e valor, de modo a não se dar aos mesmos fatos valores distintos, a Ministra Relatora, Nancy Andrighi, num didático e excelente voto, decidiu pela prescrição decenal, no que foi seguida pela maioria dos Ministros (Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Lázaro Guimarães - Desembargador convocado do TRF da 5ª Região).

A importância desse julgamento está não apenas no fato de estar muito bem fundamentado para trazer à matéria a mesma posição mantida pela corte há anos, mas, com destaque, no de que traz luz sobre um ponto de extrema e atual relevância: uma das bases legais para a manutenção de dados pessoais (de pessoas físicas) pelos controladores desses dados, a saber, o prazo prescricional para ajuizamento de demanda judicial, em razão do exercício regular de direitos, com base no inciso VI do art. 7º da Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD).

Atualmente, com a promulgação da LGPD, cuja entrada em vigor foi prorrogada pela MP 869/2018 para agosto de 2020, todas as pessoas físicas, jurídicas, privadas e/ou públicas, terão que fazer valer os direitos da privacidade de dados pessoais dos indivíduos, fazendo o correto e temporal tratamento de dados de forma a atender aos interesses dos seus titulares em primeiro lugar.

No entanto, existem as bases legais que permitem àqueles que tratam os dados ter fundamentos tais a resguardar o uso e o armazenamento de tais dados, dentre os quais a questão de periodicidade para tanto, neste caso, relacionada ao do possível exercício regular de um direito daquele que trata frente ao do titular do dado.

Por isso que julgados como esse do STJ nos faz olhar para tal decisão sob o véu da LGPD, visto que o Código Civil deixa a brecha interpretativa para que ações de reparação de danos extracontratuais sejam encaixadas em um dos prazos prescricionais dos artigos legais supracitados, a saber, de 3 ou 10 anos.

Essa variação de lapso temporal para o exercício regular de um direito reparatório traz a questão de por quanto tempo o titular do dado teria que aceitar mantê-lo na base de dados de um controlador, de modo a deixar que este, pelo tempo legal correto, possa se precaver de qualquer situação danosa que o obrigasse a buscar proteção judicial.

Essa decisão do STJ não implica em posição pacificada, mas, por certo, é indício grande de que o tema tende a andar por um caminho que poderá trazer certos “desentendimentos” entre os titulares de dados pessoais e os controladores/operadores de tais dados, visto a grande variação de tempo entre uma posição e outra (3 ou 10 anos).

Importante que o jurista esteja atento, não apenas sob o enfoque da consultoria legal para os que tratam os dados e, portanto, como e por quanto tempo devem mantê-los mas, em especial, sob a óptica dos que atuam nos campos judiciais e/ou arbitrais, exigindo que tenham olhares atentos às bases legais para saber se os titulares dos dados poderão ou não pleitear que seus dados sejam apagados de uma base de dados de um controlador em determinado período de tempo.  

Assunto intrigante, que exigirá boas argumentações, trabalho atento e olhar negocial, pois, mais do que meramente resguardar os interesses de seu cliente (seja ele o controlador ou o titular dos dados), o advogado deverá olhar todo o contexto onde esses dados estão inseridos, os motivos de seu tratamento e o entorno negocial e econômico, de modo a não gerar, por um olhar engessado ou míope, um problema judicial e/ou mercadológico precedente para discussões cascateadas, judicializando tema que poderia ser avaliado e discutido em âmbito puramente negocial.

 

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Ibijus


Sobre o autor

Andréa Silva Rasga Ueda

Bacharel (1993), Mestre em Direito Civil (2009) e Doutora em Direito Civil (2015), todas pela USP, atuando como advogada desde 1994, tendo atuado até 2006 em escritórios próprio e de terceiros (médio e grande portes), com grande experiência no consultivo e contencioso civil (especialmente em contratos), comercial, societário (elaboração de atos societários de Ltdas. e S.As, de capital aberto e fechado; participação em M&A, IPOs, Private Placement), bem como em transações imobiliárias e questões envolvendo mercado de capitais e compliance. De 2007 até 2018 criei e gerenciei departamentos jurídicos de empresas nacionais e transnacionais. Atualmente atuo como consultora jurídica corporativa e como diretora jurídica na startup de geração distribuída Sunalizer, com atuação nacional e internacional. Forte experiência no regulatório de energia e GD, de 2007 a 2012 e 2018-atualmente, de mercado de capitais e de construção de torres para suporte às antenas de empresas de telecomunicações (desde 2013). Professora da Escola Superior da Advocacia (ESA-SP), entre 2001 e 2002, na matéria de Prática em Processo Civil, bem como assistente de professor na matéria Direito Privado I e II, na Faculdade de Direito da USP, durante o ano de 2007. Especializações: Consultivo civil/empresarial (Contratos) e societário; M&A e atuação em estruturações de operações financeiras; mercado de capitais; regulatório de energia e telecomunicações. Meu site é: deaalex.wordpress.com. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/6450080476147839


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