Por Beatriz Martins de Oliveira Sampaio em 10/12/2021 | Processo Civil | Comentários: 0
O Código de Processo Civil (CPC) estabelece como regra que o ônus probatório sobre um fato incumbe a quem o alega; assim, ele cabe ao autor quanto aos fatos constitutivos de seu direito, e ao réu, quanto aos impeditivos. Contudo, alguns diplomas preveem a possibilidade de inverter essa regra, facilitando a produção da prova em favor de uma das partes.
O art. 42, §2º, da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) previu essa possibilidade, de inverter o ônus da prova em favor do titular de dados pessoais. Assim como ocorre no Código de Defesa do Consumidor (CDC), esse direito processual é assegurado se houver (i) verossimilhança da alegação, (ii) hipossuficiência do consumidor (CDC) ou titular de dados (LGPD) e (iii) demasiado ônus na produção da prova.
Verossimilhança, entende a doutrina, é a confiabilidade do relato sobre a relação material, independentemente de eventuais provas. Já a hipossuficiência consiste na situação de desvantagem de uma parte em relação a outra. Por fim, o demasiado ônus para a produção da prova refere-se à elevada dificuldade de uma parte produzi-la em razão de um obstáculo intransponível ou de vencimento não razoável.
Ao vislumbrarmos essas previsões no contexto socioeconômico atual, chamado Sociedade da Informação, verificamos que o titular de dados pessoais sempre está em desvantagem em relação ao agente de tratamento, pois o próprio cenário da sociedade informacional é formatado para beneficiar quem detém as informações, os dados pessoais etc.
O problema é que o artigo 42 estabelece a aplicação desse direito como uma faculdade do julgador, e não uma obrigação, contrapondo-se à constante fática de hipossuficiência do titular. Em outras palavras:
“Podemos concluir, portanto, que a Sociedade da Informação implica, necessariamente, em que o titular de dados seja hipossuficiente em face do agente de tratamento. É a própria concepção deste arranjo o que assim determina, tornando a análise casuística e subjetiva — ora imbuída pela LGPD aos juízes — demasiadamente perigosa.” (Oliveira; Sampaio, 2021, p. 521).
Retomando o caput do artigo, observamos que a sua finalidade é garantir que o titular de dados pessoais eventualmente lesado possa ser indenizado. Assim, essa inadequação pode influenciar o próprio direito material, o direito fundamental a ser indenizado. Tratar da incongruência dessa “faculdade” estabelecida no artigo é apenas a raiz, contudo, do problema que se erguerá: Diante do texto legal, quais critérios orientarão os julgadores acerca dessa hipossuficiência dos titulares? A própria Lei parece se afastar da realidade fática.
Mesmo diante do risco de errar a previsão, o direito processual concedido pela lei, pela falta de conhecimento sobre a Sociedade da Informação, arrisca-se a ser benefício concedido a poucos, em situações excepcionais, quando, na verdade, deveria ser garantido a todos, em situações recorrentes e comuns.
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Fonte: OLIVEIRA, Beatriz Martins; SAMPAIO, Vinícius Garcia Ribeiro. A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NA LGPD. In: Information Society and Law Review: Anais do III Congresso Internacional Information Society and Law. São Paulo: Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, 2021. Disponível em: https://informationsocietyandlaw.files.wordpress.com/2021/12/anais-3o-information-society-and-law-6.pdf
As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Ibijus
Sobre o autor
Doutoranda em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestra em Direito da Sociedade da Informação pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, Especialista em Direito Processual Civil e Bacharel em Direito pela mesma instituição. Advogada.
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