Por Inara de Pinho em 04/11/2022 | Direito Tributário | Comentários: 0
Tags: reduçãofiscal, Direito Tributário, empresas, setordeeventos.
Olá pessoal!
Neste artigo compartilho conhecimentos sobre a sistemática da alíquota zero: o que é, a quem se aplica, qual o fundamento jurídico requisitos para enquadramento e por quanto tempo pode ser usufruído.
I. O setor de eventos e atividades afins
A boa notícia para as empresas que desenvolvem atividades ligadas ao setor de eventos é que podem praticar alíquota zero (0%) sobre as receitas e os resultados das atividades econômicas especificadas, na Portaria do Ministério da Economia nº 7.163, de 21 de junho de 2021, desde que estejam relacionados à:
I – realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;
II - hotelaria em geral;
III - administração de salas de exibição cinematográfica; e
IV - prestação de serviços turísticos, conforme disciplinado pelo art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
II. Qual o fundamento legal desse benefício tributário?
O Plano Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), criado pela Lei 14.148/2021, trouxe, dentre outros benefícios, a redução à zero (0%) das alíquotas incidentes sobre alguns tributos que serão especificados abaixo, desde que a empresa tenha atividades primária ou secundárias enquadradas nos CNAE’s descritos na Portaria regulamentadora da referida lei.
A Lei do PERSE definiu o seu objetivo e a quem se aplica, remetendo à Portaria regulamentadora a definição específica dos CNAE’s beneficiados pelo Programa.
Nesse sentido, a recente Lei nº 14.148, de 03-5-2021, tem o seguinte objeto:
Dispõe sobre ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19; institui o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) e o Programa de Garantia aos Setores Críticos (PGSC); e altera as Leis nos 13.756, de 12 de dezembro de 2018, e 8.212, de 24 de julho de 1991.
Em seu art.2° definiu-se a quem se aplica os benefícios previstos nessa lei:
Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente:
I – realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;
II – hotelaria em geral;
III – administração de salas de exibição cinematográfica; e
IV – prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
§ 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo.
Sendo assim, o § 2º do art. 2º da Lei deixa claro que a enumeração de seu § 1º não é taxativa. Dessa forma, a lista de atividades do § 1º caracteriza a figura da “norma em branco” – que pode ter seu conteúdo complementado por regra infralegal. E essa complementação de conteúdo se dá por ato administrativo do Ministério da Economia.
Esse ato do Ministério da Economia é a Portaria ME 7.163, de 21-6-2021 que:
Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021.
O benefício tributário em questão consta do art. 4º, da Lei do PERSE:
Art. 4º Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei: (Promulgação partes vetadas)
I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep);
II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e
IV – Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ).
III.O que é alíquota zero (0%) do PERSE?
O benefício da alíquota zero (0%) corresponde a reduzir à zero o percentual incidente sobre os seguintes tributos: I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep); II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ).
Dessa forma, as empresas poderão reduzir a zero o percentual dos tributos acima descritos, o que significa deixar de recolher os mesmos pelo prazo previsto na lei. Registre-se que não se trata de isenção e nem de imunidade tributária.
IV. A quem se aplica o benefício fiscal?
As empresas pertencentes ao setor de eventos, cuja atividade tenha o CNAE no rol dos Anexos I e II da Portaria do Ministério da Economia nº 7.163, de 21 de junho de 2021[1] fará jus aos benefícios previstos na Lei do PERSE.
O critério de enquadramento, na PORTARIA ME n° 7.163/2021 que complementa a mencionada Lei está em seu art. 1º:
Art. 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II.
§ 1º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse.
§ 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
E a mesma Portaria separa os Anexos da seguinte forma:
ANEXO I: Lista de códigos (CNAE) que se enquadram nos incisos I, II e III do § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021
ANEXO II: Lista de códigos (CNAE) que se enquadram no inciso IV do § 1º do art. 2º da lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, quando considerados prestadores de serviços turísticos, conforme art. 21 da lei 11.771, de 17 de setembro de 2008.
Vale destacar ainda que o benefício é aplicável somente às empresas do lucro presumido ou lucro real, uma vez que, no regime do simples nacional não há recolhimento específico de tais tributos.
A Instrução Normativa RFB 2114/2022 deixou claro que o benefício fiscal não se aplica às pessoas jurídicas tributadas pela sistemática do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), de que trata a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.
Além disso, há dois outros requisitos que serão abordados a seguir:
V. Dos requisitos de data de início das atividades e cadastro no CADASTUR
Segundo a Portaria ME n° 7.163/2021, há mais dois requisitos a serem cumpridos:
a) no §1°, restringe os benefícios do PERSE às empresas que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I;
b) no § 2º do art. 1º: a prévia inscrição no CADASTUR: “§ 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008”.
Ocorre que essas exigências não constaram da Lei do Perse e, em tese, não poderiam ser exigidos por meio do Portaria, sendo necessária medida judicial para afastar tais requisitos e fazer valer os benefícios tributários à empresa beneficiária.
Contudo, no dia 01 de novembro de 2022 foi publicada Instrução Normativa da RFB Nº 2114 que colocou os dois requisitos como alternativos, isto é, que a empresa já estivesse, em 18 de março de 2022, exercendo as atividades econômicas constantes do Anexo I da Portaria ME nº 7.163, de 2021, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes dessas atividades; ou, alternativamente, que estivesse com inscrição em situação regular no Cadastur, para fins de aplicação do benefício a receitas ou resultados decorrentes de atividades econômicas constantes do Anexo II da Portaria ME nº 7.163, de 2021.
VI. Qual o prazo do benefício da alíquota zero?
A Lei 14.148/2021 definiu o prazo de 60 meses, mas a Instrução Normativa[2] publicada em 01 de novembro de 2022, regulamentou a matéria estabelecendo que o prazo do referido benefício fiscal se aplica às receitas e aos resultados relativos aos meses de março de 2022 a fevereiro de 2027.
O prazo inicial de 18 de março de 2022[3] definido como corte para o início das atividades das empresas enquadradas, bem como, cadastro no Cadastur decorre da derrubada do veto do art.4° da Lei do PERSE.
VII. O veto e a derrubada do mesmo
Apenas a título de conhecimento, o Presidente da República vetou o dispositivo do art.4°, em um primeiro momento, mediante a seguinte mensagem:
MENSAGEM Nº 186, DE 3 DE MAIO DE 2021
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, o Projeto de Lei nº 5.638, de 2020, que "Dispõe sobre ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19; institui o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) e o Programa de Garantia aos Setores Críticos (PGSC); e altera as Leis nºs 13.756, de 12 de dezembro de 2018, e 8.212, de 24 de julho de 1991".
Ouvido, o Ministério da Economia manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos:[4]
O veto se fundamentou, em apertada síntese, em suposta violação à lei de responsabilidade fiscal.
Contudo, em 18/03/2022, o Congresso Nacional derrubou o veto, razão pela qual o dispositivo passou, desde então, a vigorar no ordenamento jurídico.
E, em consequência, foi reintegrada à lei, seguindo o mesmo critério estabelecido para a vigência da lei a que foi integrada.
VIII. Possibilidade de uso da via judicial para fazer jus à alíquota zero
Em síntese, todas as empresas que exercem as atividades descritas nos CNAE’s constantes da Portaria[5], seja no ANEXO I, seja no ANEXO II, e que em 18 de março de 2022 já exerciam tais atividades ou que, nessa mesma data, possuíam, cadastro no Cadastur, podem se enquadrar na LEI DO PERSE e usufruir de seus benefícios, em especial, a alíquota zero (0%) ora tratada neste texto.
Registre-se que, o enquadramento do CNAE é o requisito elementar, mas, os dois outros requisitos, se não estiverem exatamente alinhados com a Portaria e a Instrução Normativa supra citadas, poderão ser avaliados caso a caso para verificar a possibilidade de pleitear judicialmente a inclusão no Programa e se beneficiar da alíquota zero.
Vale lembrar que, em várias situações é possível obter o provimento judicial para que a empresa possa praticar a alíquota zero com fundamento na lei do PERSE, mas sem este não se deve deixar de recolher a tributação em questão, pois estará sujeita além da autuação fiscal, de sofrer restrições no CADIN, e, ainda ter negada a Certidão Negativa de Débitos Fiscais – CND, o que poderá comprometer a atividade empresarial.
Referências:
BRASIL. Lei n° 14.148, de 3 de maio de 2021. Dispõe sobre ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19; institui o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) e o Programa de Garantia aos Setores Críticos (PGSC); e altera as Leis nos 13.756, de 12 de dezembro de 2018, e 8.212, de 24 de julho de 1991. Congresso Nacional. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14148.htm> Acesso em 01 de julho de 2022.
BRASIL. Instrução Normativa n° 2114, de 31 de outubro de 2022. Dispõe sobre a aplicação do benefício fiscal previsto no art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, que instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). Receita Federal do Brasil. Disponível em <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=126880> Acesso em 03 de novembro de 2022.
BRASIL. Portaria 7.163, de 21 de junho de 2021. Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021. Ministério da Economia. Brasília-DF. Disponível em <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-me-n-7.163-de-21-de-junho-de-2021-327649097> Acesso em 07 de julho de 2022.
(Imagem de Ally J por pixabay)
[1] Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-me-n-7.163-de-21-de-junho-de-2021-327649097
[2] Instrução Normativa RFB Nº 2114, DE 31 DE OUTUBRO DE 2022, publicada em 01 de novembro de 2022.
[3] Definido pela Instrução Normativa RFB Nº 2114, DE 31 DE OUTUBRO DE 2022, publicada em 01 de novembro de 2022.
[4] Art. 4º
(...)
Razões do veto
"A propositura legislativa estabelece que ficam reduzidas a 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contados a partir do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep, Cofins, CSLL e IRPJ, tributos incidentes sobre as receitas decorrentes das atividades de eventos ou sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei .
Todavia, apesar de meritória a intenção do legislador, a medida encontra óbice jurídico por acarretar renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, por violar o inciso II do art. 150 da Constituição da República, uma vez que institui tratamento desigual entre os contribuintes em afronta à isonomia tributária e, também, por contrariar o art. 113 do ADCT, o art. 14 a 16 da Lei Complementar nº 101, de 2000 (LRF) e os art. 125 e 126 da Lei nº 14.116, de 2020 (LDO/2021)."
[5] Portaria ME n°7.163, DE 21 DE JUNHO DE 2021
As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Ibijus
Sobre o autor
Advogada atuante recuperação tributária, privacidade de dados pessoais, direito ambiental e minerário. Diretora jurídica e coordenadora de cursos no IbiJus. Professora na PUC Minas em nível de pós-graduação. Mestre e especialista em Direito Ambiental. Mais de 20 anos de carreira construída a partir da advocacia empreendedora e na docência do ensino superior. www.inaradepinho.adv.br
Método prático para advogar com recuperação judicial e administrativa de tributos
Entenda na prática como atuar e conquistar clientes e honorários!
Método prático para advogar com planejamento nas relações familiares e sucessórias e transformar a sua advocacia