Por Pedro Ramunno em 23/06/2015 | Eletrônico | Comentários: 0
A evolução da tecnologia vem sendo acompanhada de uma mudança de paradigma na indústria de software: não apenas os dados elaborados atingem maior complexidade, como as formas de distribuição e comercialização dos softwares adaptaram-se às exigências do mercado de tecnologia, constituindo diversos novos modelos de negócios. Esta mudança conceitual apresenta muitas implicações jurídicas que não podem ser desconsideradas.
Até o início da década de 1990, a aquisição de um software ocorria, basicamente, pela outorga de uma “licença perpétua” do software, que era instalado localmente na infraestrutura do adquirente, ou seja, no seu servidor local. Por tal razão que se utiliza a expressão “on premise” para fazer referência a esse modelo de distribuição e comercialização. Uma vez pago o preço pela aquisição do software, o vínculo contratual imediato se performava e a relação contratual entre as partes, a princípio, extinguia-se.
Com o desenvolvimento da tecnologia da nuvem (cloud) que permite o armazenamento e compartilhamento de dados em servidor externo, somado à gradativa redução física dos setores de TI dentro das empresas, o modelo “on premise” perdeu sua relevância, o que não significa que tenha deixado de existir. Neste contexto que se destaca o modelo SaaS (software as a service) e as diversas consequências jurídicas e econômicas dele decorrentes.
Primeiramente, o modelo SaaS pode ser definido como a forma distribuição e comercialização por meio da qual o software é disponibilizado como um serviço hospedado e acessado pela Internet. Envolve, assim, uma infraestrutura tecnológica com alto potencial de configuração e adaptação e que permite acesso por diversos usuários simultaneamente (o que é chamado “multi-inquilino” ou “multi-tenant”). As contraprestações são menores quando comparadas ao modelo on premise, além de serem periódicas.
Sendo assim, do ponto de vista jurídico-contratual, tem-se a prestação de um serviço e não a mera licença de uso de software. Como consequência, todas as determinações que são aplicáveis à prestação de serviços devem ser aqui observadas, tais como a previsão de assistência técnica ou a determinação dos padrões mínimos de operação (normalmente instrumentalizados por meio de um Service-Level Agreement – SLA). Em outros termos, as disposições relativas à prestação de serviços constantes do Código de Defesa do Consumidor devem ser respeitadas.
O modelo SaaS tem sido tão valorizado no mercado, que a quantidade de operações de reorganização societário, envolvendo ou não transferência de controle, são cada vez mais comuns. Isso ocorre por diversas razões: altas projeções de receita (estima-se que o modelo SaaS representará 25% das receitas do setor de software nos próximos 5 anos); necessidade de entrada no mercado de SaaS (ao invés de desenvolver toda uma tecnologia para se inserir no modelo, opta-se pela aquisição de uma empresa que já o tem desenvolvido e estabelecido no mercado); e melhores avaliações quando comparado com o modelo on premise (em quanto a valuation de uma empresa do modelo on premise tende a ser de 200% o valor da receita anual, a de uma empresa que opera no modelo SaaS tende a ser 650% considerando igual receita anual).
A grande questão envolvendo o modelo SaaS é o fato de nem todos aspectos serem previsíveis. Nem poderia ser diferente, considerando as características extremamente voláteis e dinâmicas deste setor. Dentre tais aspectos, vale destacar a indefinição acerca da tributação sobre o modelo de SaaS – partilhada por todo o setor de software. Na doutrina e nos tribunais há defensores da incidência tanto do ISS (tributo de competência municipal) quanto do ICMS (tributo de competência estadual) para as transações relacionadas a softwares. Enquanto o embate entre públicos não se define de forma satisfatória, seja por uma orientações homogênea da jurisprudência, seja por uma regulação, de fato, eficiente, fica o consumidor sem chão, mas curiosamente, bem longe das nuvens.
As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Ibijus
Sobre o autor
Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e mestrando em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo. Fundador e Editor Executivo da Revista Comercialista - Direito Comercial e Econômico e fundador do Instituto Brasileiro de Direito Comercial e Econômico (IBDCE). Autor do livro “Negociação e Direito – Proposições” e de diversos artigos acadêmicos relacionados ao direito de empresa. Advogado e sócio de Ramunno Alcalde Advogados.
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